quinta-feira, setembro 28, 2006

Mudasti!

Não sou como o vento, mas apeteceu-me mudar!

E tornada vento, mudando de cor ou direcção, aguardo que a bom porto eu possa chegar.

E verde, de rama, ou de esperança, é a cor que me apetece usar...



P. S. Albatroz, estas nossas conversas inuteis, fazem surtir algumas mudanças, pelo menos por agora!

segunda-feira, setembro 25, 2006

Areias da noite

















Vou colhendo
As areias cintilantes da noite,
E o manto nocturno
Vem estendendo-se sobre mim.

Surge o infinito
Do canto do olhar,
A solidão lunar magoada
Quebrou-se
E tomou as minhas mãos abertas
Percorrendo as ruas.

Perscruto os sorrisos das coisas
Que estão guardados secretamente
Como gente que se esconde.

Encontro-me no âmago da sombra,
Também escondida,
Para quem passa sem me ver.

Um dia,
Eu hei-de renascer em cada olhar,
Qual flor brotando,
E desabrochando,
E Sorver do ar
O que antes fora
Um pensamento vagueando.


E vou colhendo as estrelas
Das beiras das estradas
Velando o luar sozinho,
E vou percorrendo as ruelas,
Traçando escadas,
Fazendo o caminho.

E a nostálgica solidão
Dos nascentes e poentes
Que se quebra num olhar,
Permanece no coração,
Enquanto as mãos dormentes,
Não sentirem o calor
Das estrelas a queimar.


Contexto original da imagem: www.indoleromantica.blogs.sapo



Dor de/vida

Dói-me a vida que trespassa os dias,
E sei, inconscientemente,
Que essas feridas frias
São cantar de morte intermitente.

E é de todos o saber
Que a cura se aproxima,
E que depois de morrer,
A dor não se reanima.

Doem os dias mutilados
As janelas cerradas para ontem,
Doem os minutos atulhados,
Que na memória se encolhem.

E dói, docemente interrompida,
Por cada alento cicatrizante,
Em que se contorna a ferida,
E se faz ânimo desarmante.

E dói, insistência continuada
A par da parca percepção,
Que só depois de roubada,
A dor teve razão.

sexta-feira, setembro 22, 2006

Divagação Disparate - Porque Dizem...???


Porque dizem “os quatro cantos do mundo”, se a Terra é redonda?

Resquícios da antiguidade e do desconhecimento da verdadeira forma do planeta? Expressão muito antiga que terá chegado até aos nossos dias?

Tenho para mim que ainda hoje (muitos de) nós ainda somos quadrados, e vivemos muito metidos no nosso próprio canto.

A Terra será a nossa casa, e se, por norma as casas têm vértices e podemos dizê-las quadradas, então poderiam haver de facto quatro cantos... seriam o canto dos poderosos, o canto dos submissos interesseiros, o canto dos submissos e dependentes, e o canto dos que nada podem???

Eu ainda sou quadrada, e se o meu país é um rectângulo, de que canto fará parte?



Contexto original da imagem: www.paginas.terra.com.br

terça-feira, setembro 19, 2006

Fotografia


Traço os contornos deste dia.
Lá fora,
Ficou a maresia,
Alguém que chora,
Uma fotografia,
Um fotógrafo num dia igual
Regista mais um momento final.

Traço os troncos das árvores
Que vi caminhar na viagem,
Traço a fotografia mental
Da desvanecida paisagem.

E ficou mais um momento
Passageiro e reconhecido
Do caminho percorrido,
Do meu alheamento.

Traço o futuro deste dia
Que morre numa noite qualquer,
Renasce da madrugada
Que sustento nas mãos,
Mas durmo.
Sem saber qual o canto
Sustentado no silêncio
De todas as coisas do mundo,
Sem saber que elas saem do lugar
E posam pra meus olhos
De cada vez que me levanto.

E há vida para além de nós,
Para lá dos momentos
Que ingenuamente contamos
Como sendo só nossos.

E sustenho nas mãos apenas
A fotografia do que foi
E que não vivi.
As palavras rotas
Do que não ouvi
E pouco importam,
Pois não mais se evocam.

Traço o retrato
Do dia na sua juventude desgastada,
E lembro-me
Que nesse dia
Também eu fui nada.

Contexto original da imagem:www.cortinastelle.it


quinta-feira, setembro 14, 2006

Olhar


Gostava um dia de encontrar

A certeza e a eternidade

No olhar.



Contexto original da imagem: www.marazul.blogspirit.com

quarta-feira, setembro 13, 2006

Abraço do Equinócio


Nesta tarde,
Sobra-me o tempo disperso
Das almas vagabundas.

O segundo equinócio aproxima-se
Com seus abraços demorados

E eu sei os possíveis fados
Que as folhas cantam
Na vertiginosa viagem.

E ele é lógico,
Pois os dias e as noites
Não mais se transformam

E a vida tornar-se-á igual,
Independentemente
Dos trinados felinos
Nos telhados, sob a atenção lunar,
Independentemente
Da força da candeia eterna
A emergir dos montes.

Nesta tarde,
Sobra-me o tempo
Da exactidão e da lucidez
Do momento.

Que é tudo o que invento.

Contexto original da imagem: www.hai-kai.blogger.com.br

Fim da estação





















Próxima paragem:

Outono dourado,
Encharcado de chuva,
Chamando o Inverno.
Procura-se um abraço terno

De uns braço mornos
E um hálito quente,
Para abrandar os transtornos
Do corpo em combustão ardente...













Contexto original das imagens:
fotos.sapo.pt/xica
www.cidadesurpreendente.blogspot.com

terça-feira, setembro 12, 2006

Horas


Atiro ao ar
O despojo desta hora,
Chegou a hora de abandonar
De ir embora.

O nó feito nos cabelos
Se deslaça
Da postura firme, que os embaraça,
E volto a tê-los,
Nas duas mãos abertas
Os doces restantes minutos
Das horas ainda desertas
Que esperam astutos
De portas entreabertas.

E entro pela sala
Das horas ainda despidas
Que aguardam o resto
Do que havemos fazer das vidas.

E vagueio no vazio
Que os meus dedos hão-de povoar,
E passeio no frio
Do tempo que não cessa de passar.

E é do meu mover
Que se fazem as paredes,
E é do meu ser
Que as minhas horas são como vedes,
E do meu abandono
O poder de torná-las vazias,
E do meu sono,
Os sonhos em romarias.

Despojo a hora,
No vento triste do entardecer.
Também para a hora
É hora de morrer,
E é meu, o poder agora,
De fazer nova hora nascer.

Contexto original da imagem: www.static.flickr.com

sexta-feira, setembro 08, 2006

Meu murmúrio

Abro a janela do meu quarto
Na noite clara.
O meu corpo fresco
Assaltado pelo vento,
Chama esse cheiro desatento do teu.

Devaneio e vou para longe,
Nas asas que me deu a pele.
Já há muito que estou junto a ti,
Mas sempre perto demais.

Na insanidade em que me trazes
Abro-te também todas as portas.
Escancaro-te o meu ser;
És invasor sem Poder.

O desejo não chega,
Vai para além dele
Toda essa virilidade que não quero.
Quero a pele sorvida devagar,
Em tragos de matar a sede,
Mas sem saciá-la.
Quero fome de mil dias,
Mas paladar de provador a quebrá-la.

Não quero a explosão que carregas,
Estrelas cadentes que desmaiam e se evaporam,
Dá-me as tuas mãos dormentes,
E tomá-las-ei, quentes.

Tenho fogo e não explosão,
Que tudo acaba e começa.
Ter-te assim tão depressa,
Perde-te no trilho que dá ao coração.

Não te prometo, não te juro,
Murmuro, em língua desconhecida
O mapa na minha pele, da nossa vida

Disparate - Aprender a surfar (barato)


Mais um dia, mais uma voltinha. Mais uma vez, mais um autocarro apinhado na ida para o labor diário.
Entre “desculpe” e “com licença” e fazendo arder uns calos alheios me vou entranhando nesse colosso do autocarro.

“Maldição!”, hoje não há lugares para me sentar. Lá vou agarrada como posso, na viagem de cerca de 45 minutos, e que será seguida de um transbordo para outra com cerca de 25.

As estradas mal-amanhadas são percurso diário e conhecido como a palma da mão por alguns dos motoristas. Talvez seja esse conhecimento, esse à-vontade, essa a confiança, que lhes dará ímpeto para acelerar mais.

Nos meus devaneios, acho que sem querer, aprendi a surfar... E logo eu que sei nadar muito mal!

Quando vejo o desporto rei dos mares na TV, reparo na perícia dos pés, no equilíbrio em cima da prancha sobre as ondas, pernas ligeiramente arqueadas, consoante a ferocidade da onda debaixo da prancha, até o toque da mão na onda a desfazer (não sei isto tem algum nome técnico – esta formação da onda quebrada com as mãos – não percebo nada de surf!) é semelhante ao equilíbrio dentro do grande bólide nas curvas, ao toque que às vezes se dá no vidro com as mãos (mas este é para não cair!)

Então fico a imaginar esta brincadeira, sempre que viajo de pé no autocarro, tento não agarrar-me a nada, só dobrar ligeiramente, e consoante a inconstância da onda, os joelhitos e equilibrar-me em cima da prancha.

De repente, eu e outros surfistas (não de banheira, mas do bus), mergulhamos... em vez da onda a quebrar-se, foi a travadela num buraco da estrada, em vez da água, foi o baptismo da queda no colo do vizinho que está a ver o espectáculo...

Está visto que surfar, não é para mim!

E enquanto as estradas forem tão sinuosas como as ondas, enquanto os instrutores (leia-se motoristas) teimarem que fazendo-nos cair da prancha, vamo-nos sentindo surfistas amadores, no meio das ondas do percurso diário. Enquanto o custo geral da gasolina no transporte próprio suplantar os cerca de 30 ou 40 euros, que custa aprender a surfar na ida para o trabalho e na vinda, vamos remediando os trajectos nas ondas sinuosas do dia-a-dia.

E agora, até quase sentimos a brisa marítima, nos novos transportes com ar condicionado, de tal maneira é a temperatura muito pouco amena que se faz sentir em alguns deles... Com o risco de ser molhada com os pingos das estalactites que me pendem do nariz, e com as janelas abertas em simultâneo que fazem escorrer riozinhos de água das janelas, acho que finalmente arranjei uma pequena justificação para, finalmente, comprar um fato de surf!





Contexto original das imagens: www.ambienteonline.pt

quinta-feira, setembro 07, 2006

















Sentei-me na sombra.
Esperei a calmaria
Do sorriso das marés
E veio sobre mim
A maresia desconcertante
Da nostalgia das coisas.

E ela sorriu de volta
Sentada comigo,
Trazida no colo
E firmemente abraçada
Em braços confusos,
Entre o abraço,
E o desembaraço
Das coisas inúteis de que se gosta.

Abri o armário entaipado,
E muito gasto dos sonhos
E procurei a gaveta da nostalgia
Que de repente vi estar cheia
E transbordar
Até aparecer no marulhar gritante.

Ergui-me e deixei-a cair
Numa torrente flutuante,
Entre a face e as marés,
Entre as areias e os pés.

E enquanto o sol me aquece
Eu esqueço a inutilidade
Agarrada nos braços,
Disfarçando os meus cansaços.

E procuro a sombra
A saber a maresia,
Até que as águas se vertam
E deixem ao largo a nostalgia.



Contexto original da imagem: www.galerias.escritacomluz.com

Não aconteceu? E ainda pode? Porque (não)?

Já suspeita, eu me confesso saudosa. E aproveitando uma temática que me abordaram por estas bandas, talvez saudosa daquilo que passou e não vivi ou não experimentei.
Perda de tempo? Muito provavelmente, mas que esta perda de tempo não é devaneio só meu, nisso eu creio.

A vida prega partidas a toda a gente, nas escolhas que parecem acertadas, no dobrar da esquina em que aparece um obstáculo metamórfico que pode ser uma perda, um alguém inesperado, uma situação imprevista. Os obstáculos nunca são coisa definida, têm o estranho dom da metamorfose. E às vezes esses obstáculos somos nós próprios...

Acho que muitas vezes fui obstáculo de mim mesma, porque tendo um caminho previamente estipulado, e embora me fosse apresentado um atalho, ou caminho paralelo, só não terei ido por esse caminho, não porque não fosse aliciante, ou porque não tivesse vontade de o tomar, mas porque preferi ser fiel (ou teimosa) e seguir o primeiro caminho traçado.

Pensar no que não foi, não é sinónimo de arrependimento. Nem sempre estamos arrependidos quando olhamos para trás. Às vezes gostávamos de ter feito mais daquilo que fizemos para trás, sem lamentar o que foi feito. E o mal (ou bem) é que o tempo, além de não voltar para trás, parece estabelecer momentos precisos para alguns acontecimentos... Isto é o que pensam algumas cabeças (a minha também – tipo “não tenho idade para isto”), mas há quem (e admiro essa capacidade) fuja à suposta “ordem natural das coisas” e estabeleça a sua própria ordem e torne os “não-acontecimentos” em acontecimentos de verdade, independentemente do timming que é imposto pela ordem das coisas socialmente.
O que me/ nos impede de alterar o timming das coisas, no caso dos acontecimentos reversíveis, ou possíveis? Só a nossa vontade? Medo? (De abanar muitas vezes o alicerce sobre o qual erguemos a nossa estabilidade actual?) (De mudar?)

Procuro muitas vezes dentro de mim a resposta, e sei que ela está dentro de cada um, em razões diferentes. Há coisas das quais não podemos fugir, do fim da vida (nossa e dos outros, que consequentemente nos influenciarão) do poder do dinheiro, que ou temos ou não temos, da saúde (idem aspas), e estes –( no caso do dinheiro e da saúde, não os tendo) parecem-me os mais redutores. O resto, não mencionando o factor Sorte, porque ficaria a divagar sobre o que ela quer dizer eternamente, é da nossa vontade que construímos. Será que esse resto é tão pequeno e dá tão pouca margem de manobra para que num tempo, relativamente, não tanto oportuno, não possamos transformar em vivências os tais “não-acontecimentos”?


O Passado – de onde nos construímos e viemos, do dia de ontem, das memórias más e boas que guardamos, resumidamente.

Então em que tempo verbal se situam os “não-acontecimentos”??? Se eu compusesse uma gramática para definir semanticamente em que tempo decorrem coisas como os “não-acontecimentos” certamente que hesitaria entre dois: para aqueles que olham em frente sem nostalgia do que não fizeram ou não viveram seria NUNCA, para mim e para aqueles que discutem a profundidade que eles mantêm no Presente: SEMPRE...

Indagações=muitas, conclusões=obviamente, dependem de cada um...

Impotência


Quando chega a madrugada e tenho os braços vazios, quando a boca se cala e as palavras ficam submissas ao nó que me estrangula a garganta.
Quando amo e as acções se tornam tão inúteis quanto o vazio que tenho nos braços. Quando grito e os teus ouvidos se cerram porque grito com os olhos e fiquei muda.




Quando o fio está prestes a partir-se e não tenho já forças para segurá-lo... e tu já o largaste antes dele fugir.

Não sei o que fazer com aquilo que terei para dar.






Contexto original da imagem: www.mgrande.com


quarta-feira, setembro 06, 2006

Embriaguez



Bebi tuas palavras,
Nos vermelhos e ébrios luares,
Flores Azuis em quintais laranja,
Que povoavam fecundos os ares.


Embriagada dessas palavras
De tanto silêncio que me deste,
Do fundo de teu ser agreste,
Pensava serem descritivas paisagens,
O indecifrável das tuas mensagens.

As palavras que nunca dizias,
Bebia-as sofregamente,
Na languidez fatal dos dias,
No ardente calor de noites frias,
No trabalhar solitário da mente.

E estou dispersa e vagabunda,
Em todos os fonemas que não ouvi,
Eu sou aquela que se inunda,
Dos sonhos que nunca vivi.

E em sonhos tão pouco audazes,
Que eu até achava que tinha,
Esperei da tua boca, capazes,
Palavras que não me deixassem sozinha.



Desfocada, nas lágrimas,
Ou nesse vinho que ainda me dás,
Devaneios em luares claros,
Numa verdade escondida,
Que ora se mostra em dias raros,
Ora permanece bebida.

Agora os vinhos estão a azular,
São os barcos que cavalgam na pista,
De noite são sois a brilhar,
Pra quê sobriedade realista?

Fico ébria no registo,
Ressacando alvorada,
Trago no colo flores de xisto,
Em mundo bêbado de nada.

Este trago, este sorvo,
Já não tem sabor possível,
Sou já liquido e morro,
Em cor de vinho indefinível.

Contexto original das imagens:

portfólio de António Paulo in foto.sapo.pt

www.zedoqueijo.com.br

Há dias...


Há dias em que a terra e as noites
Não me dizem nada,
Há dias em que o mar
E o seu eterno sussurro
Passam de mansinho
Sem o seu cumprimento azul.

Há dias em que as gentes
Não são gentes,
E se esqueceram da alma
No meio de tudo
O que deixaram no sono,
No meio dos sonhos
Que ficaram esquecidos.

Há dias sem alma,
Há palavras sem força na voz
Há dias de estranha calma
Em que sabemos estar sós.

Hoje???

Sei que há este dia,
Faça ou não parte
De qualquer estranha profecia,
Ele está por toda a parte.

Também eu me esqueci dos sonhos,
Nem me lembro se trouxe a alma
Para prantar o dia de hoje.


De todos os receios medonhos,
Sobra-me estranha calma
Deste tempo que me foge.